21 março 2020

Miguel Torga: "A um Negrilho"


Negrilho (Ulmus minor): árvore caducifólia de grande porte, da família das Ulmáceas, pode atingir mais de 20 metros de altura e apresenta tronco grosso com casca áspera, copa ampla com folhagem densa e ramos finos, folhas simples e ovadas de margens serradas, flores esverdeadas ou avermelhadas e sâmaras quase sésseis, sendo também conhecida por lamegueiro, mosqueiro, olmo, ulmeiro, etc.. [in Infopédia]
Mais informação em: http://www.florestar.net/negrilho/negrilho.html


Neste tempo de pandemia do terrífico coronavírus COVID-19 e de reclusão domiciliária em que se encontram milhões de pessoas, por determinação das mais altas autoridades político-sanitárias, um dos estratagemas mais válidos para mitigar a ansiedade e a angústia é a leitura e/ou audição de poesia, quer recitada quer cantada.
Neste Dia Mundial da Poesia que é também o Dia Mundial da Árvore apresentamos o poema "A um Negrilho", de Miguel Torga, dito pelo autor. O texto foi escrito na aldeia natal, S. Martinho de Anta, no concelho de Sabrosa, a 26 de Abril de 1954, e primeiramente publicado em 1956, no volume VII do seu "Diário". O registo fonográfico aconteceu em meados de 1987, para fazer parte do duplo LP "Miguel Torga: 80 Poemas", editado no mesmo ano, assinalando o 80.º aniversário do nascimento do poeta. A reedição do álbum em disco compacto deu-se em 1995, o ano da morte. Há já um quarto de século que o autor de "Orfeu Rebelde" não se encontra fisicamente entre nós, mas perdura na memória daqueles que com ele conviveram e em todos quantos se alimentam da sua obra: a poética e também a narrativa, mormente os contos que formam os livros "Bichos" e "Contos da Montanha", cuja leitura recomendamos vivamente.

No que concerne à poesia na rádio pública, temos na Antena 2 as rubricas "A Vida Breve" [>> RTP-Play] e "O Som Que os Versos Fazem ao Abrir" [>> RTP-Play], ambas realizadas por Luís Caetano (e aproveitamos para enaltecer, uma vez mais, este profissional da nossa rádio), mas nada existe nas Antenas 1 e 3. Porquê? No caso do primeiro canal da rádio do Estado, a ausência de um apontamento de poesia recitada é particularmente censurável, atendendo à boa tradição que o canal teve nesse capítulo desde os seus primórdios e que se manteve até 2003, quando terminou a memorável rubrica "À Esquina do Mundo", de António Cardoso Pinto, consagrada à poesia compilada na monumental antologia "Rosa do Mundo: 2001 Poemas para o Futuro" (Assírio & Alvim, 2001). A lacuna de poesia dita na Antena 1 torna-se ainda mais gritante em face da indigência poética da esmagadora maioria das cançonetas que escolheram para preencher a 'playlist', deixando de fora tanta e boa poesia cantada que até hoje se gravou na língua de Camões.



A um Negrilho



Poema de Miguel Torga (in "Diário VII", Coimbra: Edição do autor, 1956; "Poesia Completa", Publicações Dom Quixote, 2000, 2.ª edição, 2002 – p. 519)
Recitado pelo autor* (in 2LP "Miguel Torga: 80 Poemas": LP 2, EMI-VC, 1987, reed. EMI-VC, 1995)


Na terra onde eu nasci há um só poeta.
Os meus versos são folhas dos seus ramos.
Quando chego de longe e conversamos,
É ele que me revela o mundo visitado.
Desce a noite do céu, ergue-se a madrugada,
E a luz do sol aceso ou apagado
É nos seus olhos que se vê pousada.

Esse poeta és tu, mestre da inquietação
Serena!
Tu, imortal avena
Que harmonizas o vento e adormeces o imenso
Redil de estrelas ao luar maninho.
Tu, gigante a sonhar, bosque suspenso
Onde os pássaros e o tempo fazem ninho!


S. Martinho de Anta, 26 de Abril de 1954


* Miguel Torga – voz
Gravado nos Estúdios Valentim de Carvalho, Paço d'Arcos, nos dias 30 de Junho, 1 e 31 de Julho de 1987
Engenheiro de som – Pedro Vasconcelos
Montagem – Miguel Gonçalves
Montagem digital – Fernando Paulo Boavida, nos Estúdios Valentim de Carvalho, Paço d'Arcos
URL: http://cvc.instituto-camoes.pt/figuras/mtorga.html
http://purl.pt/13860/1/miguel-torga.htm



Capa do duplo LP "Miguel Torga: 80 Poemas" (EMI-VC, 1987)
Concepção – Fátima Rolo Duarte
Fotografia – Manuel Cardoso

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