07 abril 2008

"Vozes da Lusofonia" em inglês?!



Conforme já disse anteriormente considero o programa "Vozes da Lusofonia" (Antena 1, domingos às 9:00), realizado e apresentado por Edgar Canelas, um dos bons exemplos do serviço público de rádio. Porque é um espaço (um dos escassos da rádio portuguesa) que se dedica à divulgação dos discos que se vão produzindo em Portugal e, fazendo jus ao título, também no mundo lusófono, muitos dos quais são ignorados pelos fazedores de 'playlists'. E como o programa é feito em conversa com os próprios artistas o mesmo adquire um acrescido interesse. Sendo eu um assíduo ouvinte, também não falhei a edição do passado domingo. Agora o que me intrigou de sobremaneira foi a emissão ter sido dedicada a uma cantora que canta em inglês, no caso, uma tal Rita Redshoes. Não está em causa a qualidade interpretativa que a cantora possa eventualmente ter. O que sinceramente não consigo entender é como uma intérprete que canta em inglês (mas também podia ser em castelhano, francês, alemão, grego, russo, hindi, mandarim, etc.) se encaixa no conceito da lusofonia. Por sinal, já não é a primeira vez que no programa – que volto a lembrar se chama "Vozes da Lusofonia" – se ouve cantar na língua de Sua Majestade pois já por lá passaram, por exemplo, o David Fonseca e o grupo Sean Riley & The Slowriders. Eu pergunto: a palavra "lusofonia" já não significa o que é suposto significar? Façamos um pequeno exercício. Suponhamos que na Inglaterra um(a) qualquer súbdito(a) de Queen Elizabeth, the Second, resolvia gravar um disco cantado na língua de Camões e que num dos canais da BBC Radio existiria um programa chamado "Voices of Anglophonie". Alguém acredita que o realizador desse programa convidaria esse(a) cantor(a) para ir lá apresentar tal disco? E alguém acredita que na 'playlist' desse mesmo canal da BBC Radio o(a) mesmo(a) cantor(a) tivesse primazia ou, pelo menos, fosse tratado(a) em pé de igualdade com, por exemplo, os Beatles, os Rolling Stones, os Pink Floyd ou a Amy Winehouse? Pois é! Mas na portuguesa Antena 1, é mais fácil ouvir um David Fonseca, uns The Gift, uns Hands on Aproach, uns ZZ Special ou uns Fingertips, que uma Amália Rodrigues, um Carlos Paredes, um Luiz Goes, um José Afonso ou um Adriano Correia de Oliveira. Muito anómala, para não dizer pútrida, é a situação a que chegou a rádio tutelada pelo Estado, o qual se tem claramente demitido das suas responsabilidades de regulação e fiscalização! É verdade que existe um Provedor do Ouvinte mas é como se não existisse porque os seus veredictos são pura e simplesmente ignorados por Rui Pêgo e seus adjuntos.
Quero ainda dizer que nada tenho contra os portugueses que decidem cantar em inglês ou noutra língua estrangeira. A criação musical é livre e cada um usa os instrumentos de expressão que muito bem entende. Agora o que jamais se poderá aceitar é que na rádio de serviço público (paga pelos cidadãos e empresas de Portugal) tais intérpretes sejam favorecidos comparativamente aos seus pares que cantam na língua materna, desde os nomes consagrados aos novos talentos. A música cantada em inglês (ou em qualquer outra língua que não o português ou o mirandês, as únicas línguas oficiais de Portugal) deve ser tratada toda de igual maneira, independentemente da sua origem e do local onde tenha sido produzida (Reino Unido, Estrados Unidos, Portugal ou Cochinchina). Não escondo, no entanto, que sempre prefiro a música (alguma) feita pelos autóctones da Grã-Bretanha, da América do Norte ou da Austrália à dos macacos de imitação cá do burgo, do mesmo modo que não troco a nossa Amália por uma qualquer nipónica por melhor que ela cante o fado.