20 março 2024
Rão Kyao & Lu Yanan: Primavera
© Xinhua News
Festival da Primavera 2024 no centro histórico de Macau (Praça do Leal Senado)
O Festival da Primavera: a festa mais importante para os chineses
O Festival da Primavera é sinónimo do Ano Novo Chinês e é a festa tradicional mais importante da China, que marca o reencontro das famílias. Logo desde o Festival de Laba, os chineses já começam a preparar os festejos da nova data, que em 2024 [Ano do Dragão] recai a 10 de Fevereiro.
Sabe de onde provém o Festival da Primavera? Reza a lenda que existia um monstro de nome Nian (significa ano) que, na véspera do último dia do ano lunar, surgia para semear a destruição, arruinando colheitas e edifícios. Com o passar do tempo, descobriu-se que o monstro temia a cor vermelha, a luz das chamas e ruídos estrondosos. Por conseguinte, as famílias passaram a adornar as suas residências com dísticos de papel vermelho e janelas de papel recortado, bem como a detonar panchões, e finalmente conseguiram repelir o monstro. Estas práticas tornaram-se tradições consagradas das festividades de Ano Novo Chinês.
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Hoje em dia, o Festival da Primavera não é um feriado exclusivo apenas para os chineses a nível nacional, é-o também para os emigrados. Em 22 de Dezembro de 2023, a Assembleia-Geral das Nações Unidas estabeleceu o festival como um feriado oficial das Nações Unidas. Em 2016, o estado do Rio de Janeiro, no Brasil, designou-o como um feriado oficial estadual.
Pode constatar-se sempre uma série de actividades festivas neste festival, como as danças de leões e dragões, espectáculos de fogo-de-artifício e de lanternas, bem como o desfile de carros alegóricos e outras celebrações, que ocorrem nas ruas e praças da Chinatown ou no centro de cidades em muitos países e regiões.
Como exemplo, o Feliz Ano Novo Lunar em Portugal teve lugar consecutivamente em 10 edições desde 2014. Devido às relações históricas e culturais únicas entre Macau e Portugal, a Região Administrativa Especial de Macau também participa no evento com grupos folclóricos. No Brasil, Timor-Leste e nos países de língua portuguesa em África também há celebrações do Festival da Primavera. [in "Diário de Notícias", 8 Fev. 2024]
Em 2024, o equinócio da Primavera aconteceu hoje de madrugada, na Europa Ocidental (03h:06, hora de Portugal de Continental). O mesmo ano em que se comemora o centenário da primeira viagem aérea entre Portugal (Vila Nova de Milfontes) e Macau, realizada pelos aviadores Sarmento de Beires e Brito Paes auxiliados pelo mecânico Manuel Gouveia, de 7 de Abril a 20 de Junho de 1924, a bordo de um velho biplano monomotor Breguet 16 que baptizaram de "Pátria". E também o ano em que se assinala o 25.º aniversário da transferência da soberania de Macau de Portugal para a República Popular da China, que ocorreu oficialmente a 20 de Dezembro 1999. Duas efemérides que nos servem de bom pretexto para saudarmos este ano a chegada da estação do renascimento da Natureza com um espécime musical tradicional chinês: "Primavera", interpretado pelo português Rão Kyao (em flauta de bambu) e pela chinesa Lu Yanan (em pi'pa). Faz parte do CD "Porto Interior" (Fundação Jorge Álvares, 2008), um álbum que é uma espécie de terceiro tramo da ponte musical luso-chinesa ou sino-portuguesa, como se queira, que Rão Kyao encetou com o LP "Macau: O Amanhecer" (1984) e continuou com "Junção Macau" (1999), gravado precisamente para assinalar a passagem do território macaense para a administração chinesa. Boa escuta!
Rão Kyao é, incontestavelmente, uma figura de primeiro plano da Música Portuguesa dos últimos 50 anos. Atestam-no a vasta e meritória discografia em nome próprio (que compreende mais de 25 álbuns, sem contar com as compilações), o reconhecimento pelos seus pares (traduzido num sem-número de participações em trabalhos alheios) e o aplauso do público [alguns dos seus álbuns foram êxitos comerciais, tendo dois deles – "Fado Bailado" (1983) e "Estrada da Luz" (1984) – sido discos de platina, por vendas superiores a 60 mil exemplares]. Com tantos pergaminhos, era da mais elementar justiça que o artista estivesse representado na 'playlist' da Antena 1. Mas não está! E porquê? Poderia supor-se que é pelo facto de se tratar de um instrumentista. O boicote à música instrumental jamais se pode aceitar num canal público generalista, mas o motivo não é propriamente esse já que na discografia de Rão Kyao também há canções, interpretadas por artistas convidados, designadamente nos álbuns "Fado Virado a Nascente" (2001) e "Em'Cantado" (2009). Portanto, se nada existe do repertório de Rão Kyao na 'playlist' da Antena 1 é por única e exclusiva vontade de quem manda na programação, de seu nome Nuno Galopim de Carvalho. E aqui chegados, uma pergunta se impõe: é lícito e tolerável que o serviço público de rádio fique condicionado aos caprichos umbilicais de quem, num determinado período, ocupa a direcção de programas?
Primavera
Música: Tradicional chinesa
Adaptação: Lu Yanan
Intérpretes: Rão Kyao & Lu Yanan (in CD "Porto Interior", Fundação Jorge Álvares, 2008)
(instrumental)
* Rão Kyao – flauta de bambu e palmas
Lu Yanan – pi'pa
Produtor musical – Rão Kyao
Produtor executivo – António Avelar de Pinho
Gravação e mistura – Estúdio Sonic State, Miraflores (Oeiras), por Luís Delgado
URL: https://www.facebook.com/officialraokyao/
https://music.youtube.com/channel/UCBmfzPfU1WrOCjmXI8KxGHQ
Capa do CD "Porto Interior", de Rão Kyao & Lu Yanan (Fundação Jorge Álvares, 2008)
Fausto Sampaio, "Porto Interior de Macau", 1936, óleo sobre tela, Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Lisboa
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Outros artigos com repertório alusivo à Primavera:
Cantos d'Aurora: "Primavera"
Roda Pé: "Primavera Alentejana"
Grupo Coral "Os Ceifeiros de Cuba": "No Tempo da Primavera"
Amália Rodrigues: "Primavera" (David Mourão-Ferreira)
Francisco Filipe Martins: "Canção da Primavera"
Grupo Coral da Casa do Povo de Santo Aleixo da Restauração: "É Lindo na Primavera"
Celina da Piedade: "Primavera"
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Outros artigos com repertório interpretado por Rão Kyao:
A infância e a música portuguesa
A vitória do azeite
"Quando os Lobos Uivam"
Em memória de Fernando Alvim (1934-2015)
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