03 fevereiro 2006
Poesia na rádio
Júlio Isidro, na rubrica da Antena 1 "Os Reis da Rádio", evocou a época em que Mário Viegas começou a recitar poesia na rádio. São muitos os actuais amantes de poesia que a descobriram pela mão do saudoso actor, primeiro na rádio e depois na televisão. Na verdade, Mário Viegas, depois do imortal João Villaret, foi dos que mais fez pela divulgação da obra dos nossos poetas maiores, sem esquecer nomes menos conhecidos e até mal amados como os surrealistas. A poesia foi nos seus primórdios uma arte da oralidade (a "Ilíada" e a "Odisseia" começaram por ser difundidas de boca a ouvidos) e Mário Viegas percebeu isso melhor do que ninguém. Ora a rádio é de todos os media aquele que melhor serve a poesia, mas inexplicavelmente esta potencialidade não tem sido devidamente explorada entre nós. Que poesia há hoje na rádio portuguesa? E mais especificamente na rádio pública? Terá de se concluir que, actualmente, a situação não é muito melhor do que no tempo em que Júlio Isidro levou Mário Viegas para a rádio. Analisando, os três canais nacionais da RDP (que são os que interessam a quem reside em Portugal continental), encontra-se apenas a rubrica "Os Sons Férteis", na Antena 2, apontamento de poesia e música, da autoria de Paulo Rato. E ainda por cima num horário ingrato para muitos ouvintes - 11 horas de segunda a sexta-feira -, o que não deixa de ser algo bizarro sabendo nós que a poesia requer tranquilidade e disponibilidade de espírito que a maior parte das pessoas não pode ter naquele momento do dia. Por que motivo não há um programa de poesia ao fim-de-semana? E esse espaço até podia ser preenchido com gravações do arquivo, o qual tem um razoável mas desaproveitado manancial de poesia dita, quer por actores de renome quer por locutores da casa. Destes últimos destacaria Maria Clara e António Cardoso Pinto ambos responsáveis por memoráveis momentos de beleza, interpelação e meditação no cantinho da rádio. É um crime de lesa-cultura tantas pérolas permanecerem esquecidas sob o pó nalguma cave ou sótão e não serem servidas aos ouvintes. Uma lacuna imperdoável do serviço público.
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