03 junho 2019

Mísia: "Garras dos Sentidos" (Agustina Bessa-Luís)


Antonio Canova, "Eros e Psique", 1793, escultura em mármore, Museu do Louvre, Paris.
© Raphaël Chipault, 2010


Romance, novela, conto, crónica, aforismo, teatro, ensaio, biografia, monografia – em todos estes géneros se distinguiu Agustina Bessa-Luís [resenha biográfica e bibliografia no site da >> DGLB]. Na poesia, porém, o seu prodigioso estro criativo não se espraiou. Em todo o caso, a escritora não deixou de corresponder ao desafio que, nos anos 90, Mísia lhe lançou de escrever um poema para um fado. Assim nasceu "Garras dos Sentidos", que abre o álbum homónimo editado em 1998, com chancela Erato.
É pois com esse poema, que Mísia canta com a música do Fado Menor, que nos associamos à homenagem que o país está a prestar a Agustina, no dia em que o barqueiro Caronte veio buscá-la ao cais da Vida para levá-la ao mundo dos que estão libertos dos grilhões do Tempo.
Não tendo lugar na 'playlist' da Antena 1, Mísia é uma intérprete virtualmente impossível de ouvir naquela rádio, fora do gueto denominado "Alma Lusa" (depois do noticiário da meia-noite de domingo até às 2:00 da madrugada). Hoje, após o bloco de anúncios promocionais que se seguiu ao noticiário das 15:00, os ouvintes diurnos tiveram a casual e excepcionalíssima oportunidade de ouvi-la, justamente a cantar este fado "Garras dos Sentidos", simplesmente porque a realizadora Ana Aranha fizera a justiça, em 2013, de incluí-lo no programa "Vidas Que Contam" consagrado a Agustina [>> RTP-Play], transmitido em reposição (seria muito anormal se tal resgate não fosse feito).



Garras dos Sentidos



Poema: Agustina Bessa-Luís
Música: Popular (Fado Menor)
Arranjos: Ricardo J. Dias
Intérprete: Mísia* (in CD "Garras dos Sentidos", Erato, 1998)




Não quero cantar amores.
Amores são passos perdidos,
São frios raios solares,         | bis
Verdes garras dos sentidos.  |

São cavalos corredores
Com asas de ferro e chumbo,
Caídos nas águas fundas.   | bis
Não quero cantar amores.  |

Paraísos proibidos,
Contentamentos injustos,
Feliz adversidade,                 | bis
Amores são passos perdidos. |

São demência dos olhares,
Alegre festa de pranto;
São furor obediente,    | bis
São frios raios solares. |

[instrumental]

Da má sorte defendidos,  | bis
Os homens de bom juízo  |
Têm nas mãos prodigiosas
Verdes garras dos sentidos.

Não quero cantar amores
Nem falar dos seus motivos.


* Mísia – voz
Ricardo J. Dias – acordeão
Manuel Rocha – violino
Custódio Castelo – guitarra portuguesa
António Pinto – viola
José Moz Carrapa – viola
José Marino Freitas – viola baixo

Direcção musical – Ricardo J. Dias
Co-direcção – Mísia
Produtor executivo – Ricardo J. Dias
Gravado nos Estúdios Xangrilá, Lisboa, em Outubro de 1997
Técnico de som – Nuno Pimentel
Mistura – Ricardo J. Dias e Mísia (Studios Plus XXX, Paris)
Técnico de som – Emmanuel Pothier
Masterização – Yves Delaunay (Dyam Studios, Paris)



Capa do CD "Garras dos Sentidos", de Mísia (Erato, 1998)
Fotografia e concepção – C.B. Aragão

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