27 novembro 2024
Camões musicado por Fernando Lopes-Graça (obras corais 'a cappella')
Obras corais a cappella de Fernando Lopes-Graça
Por: Sérgio Azevedo (compositor e docente)
Tivesse Fernando Lopes-Graça escolhido as belas letras, ao invés da música, e teria decerto feito igual e brilhante carreira: foi jornalista (fundou o jornal A Acção, em Tomar), crítico (de música, cinema, teatro e bailado) tradutor (de Rousseau, Thomas Mann, Romain Rolland, Andor Foldes e outros), musicólogo, ensaísta, e pedagogo, e em todas estas diferentes facetas fez original e esmerado uso da língua-mãe. Homem cultíssimo, colabora com Tomás Borba no Dicionário de Música, que revê e amplia, e corresponde-se com Vianna da Motta e outras doutas personalidades do mundo português de então, e a sua obra epistolar demonstra, de igual modo, o cuidado e amor por aquela que, como diria Fernando Pessoa, era também — para além da música, sua religião — a sua pátria: a língua portuguesa.
E é a língua portuguesa, e os tratos de polé que esta sofre às mãos de músicos de escassa formação musical e literária, como Ruy Coelho) que mais preocupa Lopes-Graça quando este se debruça sobre o problema de como compor música sobre textos portugueses. A prosódia difícil da nossa língua impele-o a reflectir sobre a melhor maneira de solucionar os diversos obstáculos que o português apresenta. Parte da solução encontra-se nas melodias populares portuguesas, com a sua imaginação prosódica e as suas aliterações e assonâncias irregulares mas belas. Pois Lopes-Graça procura, não a perfeição pedante de uma prosódia académica, correcta e fria, mas a naturalidade, humor e calor humano da prosódia que o povo, na sua ingenuidade, inventa, infalivelmente correcta de um ponto de vista artístico, senão mesmo perfeita nos contextos em que é usada. E se Lopes-Graça não vai buscar exemplos demasiado concretos à prosódia de um Stravinski, de um Janacek ou de um Bartók, tal deve-se apenas ao facto de cada língua ser única, e o que vale para uma, torna-se inútil noutra.
Mas ouçamos o compositor (in A Música Portuguesa e os Seus Problemas II, ed. Cosmos, 1976, artigo "A língua portuguesa e a música", pp. 54-56):
«...A acentuação multiforme do português, as subtilezas de quantidade silábica que apresenta, a sua enervante desarticulação (que grande escritor espanhol disse ser o português uma espécie de "castelhano sem osso"?), o característico smorzando das suas terminações — tudo isto são aspectos notáveis do idioma a que se me afigura não ter a generalidade dos nossos músicos prestado a devida atenção, nem haverem cabalmente enformado por enquanto a prosódia das suas produções vocais...»
«...É certo que a canção popular não pode servir de modelo, de paradigma prosódico, para a canção culta; mas não seria mau que esta por vezes aceitasse os "ilogismos" da prosódia que aquela amiúde apresenta, verdadeiros achados que só aparentemente são deslizes ou incorrecções devidos à incultura e ao simplismo do povo, o qual nisso, como em tantas outras coisas, revela com frequência verdadeira sensibilidade e gosto artístico.
Uma prosódia disciplinada e esteticamente eficiente é condição indispensável para que os próprios cantores se sintam à vontade na interpretação de um texto poético-musical; ela é um adjuvante técnico que lhes facilita não só o trabalho de respiração e articulação, como a tarefa de dar ao desenho melódico a necessária clareza...»
Também, pelo que atrás foi dito, se pode esperar da produção vocal e coral de Fernando Lopes-Graça, não só a prosódia (exceptuando-se, naturalmente, as harmonizações de melodias populares, já prosodiadas pelos músicos populares, que as criaram), mas também, e dadas as dimensões enormes desta produção (163 opus, só ultrapassados pelas quase 300 peças individuais para piano solo), a magnífica mundividência no que toca à escolha dos poetas e escritores: simplesmente, quase não existe nome grande da nossa história literária, antiga e recente, que Lopes-Graça não tenha posto em música.
Ouvir as canções para canto e piano, e as obras corais, com ou sem instrumentos, é conhecer a quase totalidade da melhor poesia portuguesa de seis séculos, incluindo a destinada às crianças: Gil Vicente, Luís Vaz de Camões, Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner Andresen, Matilde Rosa Araújo, José Gomes Ferreira, Gomes Leal, António Nobre, João José Cochofel, Eugénio de Andrade, Afonso Duarte, António Botto, Fernando Pessoa, Antero de Quental, Adolfo Casais Monteiro, José Régio, Carlos Queiroz, Carlos de Oliveira, Teixeira de Pascoaes, Raul Brandão, Bernardim Ribeiro, Aquilino Ribeiro, Bocage, Florbela Espanca, Ivo Machado, José Saramago, Camilo Pessanha, Fiama Hasse Pais Brandão, Sá de Miranda, Vitorino Nemésio, Almeida Garrett, Mário Cesariny de Vasconcelos, António Nobre, Guerra Junqueiro, Eugénio de Castro... enfim, a lista ainda continua. Destes, Fernando Pessoa, Eugénio de Andrade e Luís Vaz de Camões ganharam emérito destaque, pela quantidade e qualidade dos ciclos que lhes foram dedicados.
Mas, se as obras para canto e piano (o lied) padecem, pela sua carga histórica, de uma costela mais aristocrática e intimista (mesmo quando se trata de simples harmonizações do folclore de vários países), já as obras para coro a cappella (como as 228 canções dos 24 cadernos das Regionais), ou coro e instrumentos (como os 8 volumes das Heróicas), maioritariamente baseadas em melodias populares portuguesas e respectivos textos, e destinadas em grande parte, a corais amadores que pululavam (e pululam, felizmente!) nas colectividades e terreolas por este país fora, representam a proximidade com o povo. Não o povo idílico e imaginado à distância por realezas arcádicas e burguesias entediadas, mas o povo real, de carne e osso, a cheirar ao suor honesto de quem trabalhou arduamente a jorna de sol a sol.
É para este povo que canta, e gosta de ouvir cantar, que Lopes-Graça escreve o enorme corpus de obras para coro a cappella, e é à frente de inúmeros grupos corais amadores (com estaque, e claro, para o Coro da Academia dos Amadores de Música, coro que, renovado, ainda labuta, sob a direcção competentíssima do maestro José Robert) que leva a sua música para o Alentejo, o Minho, o Algarve, para Trás-os-Montes, as Beiras e a Estremadura. São ainda as Heróicas que os detidos, políticos e não só, entoam em segredo nas prisões infectas do Aljube, de Alpiarça, Peniche, Caxias, e até no Tarrafal cabo-verdiano. Os coros serão, para Lopes-Graça, o meio de contacto com a realidade musical, a sua sobrevivência como artista numa altura em que a maior parte da sua música de concerto está proibida; uma verdadeira filosofia artística, de vida, e de cidadania, que Lopes-Graça coloca ao serviço da cultura do seu povo.
Também a poesia espanhola (país a cuja música tanto ficou a dever) tentou Lopes-Graça: António Machado e Lorca, e a poesia e música dos judeus sefarditas (judeus de origem espanhola, expulsos pelos Reis Católicos em diáspora para o Oriente), embora no campo da poesia estrangeira (exceptuando-se, para além destes dois nomes, os vários ciclos de melodias populares de vários países, como a França, Inglaterra, Brasil, Grécia, Rússia, Checoslováquia, Hungria) o compositor se tenha limitado a Ronsard e a Tagore, o que seria de esperar, se atentarmos na riqueza inesgotável da poesia portuguesa, horizonte por demasiado vasto, nem sequer ao alcance das forças criativas ciclópicas de um Fernando Lopes-Graça.
A experiência continuada de Lopes-Graça como compositor e regente coral fez com que o seu conhecimento das possibilidades da voz humana, sozinha e em conjunto, se tornasse absoluto. Nunca propriamente "fáceis" de cantar, as obras corais de Lopes-Graça para coros amadores estão porém ao alcance de quem as queira trabalhar com seriedade. Nem simplismos, nem complicações impossíveis, mas simplicidade com constante desafio. Já as obras mais exigentes têm de ser interpretadas por coros com maior nível de preparação, sem que possam ser consideradas impossíveis. Talvez seja esse cuidado e erudição do compositor, no que toca à voz, que faz com que a maior parte, senão todas as obras corais de Lopes-Graça (incluindo o monumental e difícil Requiem), tenha vindo a ser cantada, e bem, por bons agrupamentos amadores, sendo o Coro Gulbenkian uma excepção, por se tratar de um grupo profissional, no qual todos os membros detêm amplos conhecimentos musicais (do solfejo à teoria), e cantam regularmente as maiores obras do repertório coral e coral sinfónico internacional.
Todas as questões, relativas à prosódia, à vocalidade, à beleza dos textos e ao uso das lições do folclore, e a maneira como Lopes-Graça as resolveu, são notórias nas obras escolhidas para este CD, com uma excepção: não foram cantadas peças baseadas em melodias populares, mas unicamente obras originais, quer sobre textos tradicionais — em português e castelhano — quer sobre textos de poetas portugueses. Também a dificuldade e complexidade de quase todas as colocam longe do alcance de um coro amador.
[...]
As Quatro Redondilhas de Camões, escritas entre 1951 e 1953, para a combinação de vozes femininas a 4 partes (SSAA), mostram, uma vez mais, a excelsa mestria de Lopes-Graça no tratamento do coro, e a influência comovida dos compositores portugueses e espanhóis de Quinhentos e Seiscentos.
A redondilha é o nome dado, desde o século XVI às estrofes com versos de cinco ou sete sílabas, respectivamente "redondilha menor" e "redondilha maior". Esta forma — de origem castelhana — foi muito usada pelos poetas que integram o Cancioneiro Geral, de Garcia de Resende, e, claro, por Camões. Começa, normalmente, por um mote, que é depois desenvolvido ou glosado.
Com o seu uso exclusivo das vozes femininas, as Quatro Redondilhas fazem um contraste (propositado) com as Canções de Marinheiros, estas escritas unicamente para vozes masculinas. A última das redondilhas, Verdes são os campos, é um dos poemas mais conhecidos da lírica de Camões. Claramente influenciada por Dante e Petrarca, é esta caracterizada por um bucolismo generoso e um neoplatonismo por vezes pessimista. A lírica camoniana, aliás, foca quase sempre o amor, os desenganos e desconcertos do mundo, e a mudança inexorável que a passagem do tempo provoca em tudo o que ao Homem e à Natureza diz respeito.
[...]
As Três Líricas Castelhanas de Camões, compostas entre 1954 e 1955, para coro misto SATB [soprano, alto/contralto, tenor, baixo], integram-se, mais uma vez, nas peças corais de Lopes-Graça que mostram a influência da antiga música portuguesa, com as suas cadências ornamentadas e os seus acordes puros, sem a terceira. As secções solistas de De vuestros ojos centellas (a peça mais curta e rápida, que lembra os ligeiros vilancicos) emulam mesmo os pregões do Retablo de Maese Pedro, de Falla, proximidade natural, dada a afinidade destes textos com o universo espanhol.
[...]
[Texto respigado do caderno do álbum "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", do Coro Gulbenkian, dir. Jorge Matta, PortugalSom/Numérica, 2008]
Estando em curso as comemorações do quinquicentenário do nascimento de Luís de Camões, que foi um dos três poetas eruditos que Fernando Lopes-Graça mais musicou (os outros dois foram Fernando Pessoa e Eugénio de Andrade), o trintenário da morte do ilustre compositor, que hoje se assinala, afigurou-se-nos um óptimo pretexto para uma celebração conjunta. Ora, como já apresentámos os sonetos (Op. 27 / Op. 112 / Op. 215 / Op. 231), cantados pelo tenor Fernando Serafim, acompanhado ao piano por Filipe de Sousa, na série "Camões recitado e cantado", achámos por bem focarmo-nos, na presente ocasião, em obras corais a cappella, mais concretamente nas "Quatro Redondilhas", Op. 76, pelo Coro Gulbenkian, sob a regência de Jorge Matta, e nas "Três Líricas Castelhanas", Op. 96, pelo Coro de Câmara de Lisboa, dirigido por Teresita Gutierrez Marques. Sete trechos da lapidar poesia de Camões admiravelmente servida pela primorosa música de Lopes-Graça que não podem deixar de encantar quem cultiva a música coral e susceptíveis de cativar os ouvidos menos habituados a este género de repertório. Boa audição!
Na actual grelha da Antena 2 há uma chusma de rubricas e rubriquinhas, boa parte das quais de reduzida ou ínfima relevância cultural (algumas delas mais não são que enxúndias para entorpecer os neurónios), mas não existe uma – uma sequer – consagrada à canção erudita portuguesa, seja por intérpretes solistas seja por coros, que é um património vasto e substancialmente rico (e não fosse Portugal um país de grandes poetas e de inspirados compositores que muito os dignificaram!). Só a produção de Fernando Lopes-Graça nesse domínio, abarcando o avultado acervo das suas hamonizações de canções regionais, daria para manter uma rubrica, com periodicidade de segunda a sexta-feira, durante mais de um ano. E este ano do trintenário da morte, bem poderia ser o do início dessa tão necessária rubrica. Assim a direcção de programas da Antena 2 tenha a clarividência de agir em conformidade.
E na presente data, o que fez o canal mais cultural da estação pública de rádio em memória de Fernando Lopes-Graça? Demo-nos conta de que no programa do início da manhã, Paulo Alves Guerra evocou o insigne compositor transmitindo algumas das suas peças, designadamente as "Variações sobre um Tema Popular Português", Op. 1, tocadas pelo pianista Artur Pizarro [>> YouTube Music]. No espaço do início da noite, "Baile de Máscaras", o seu animador, João Rodrigues Pedro, também teve o louvável cuidado de assinalar a efeméride, dando a ouvir duas secções ('Intermezzo' e 'Fandango') do "Divertimento", Op. 107, pela Orquestra Sinfónica Portuguesa, sob a direcção de Bruno Borralhinho [>> YouTube Music]. Não acompanhámos os espaços musicais do final da manhã ("Boulevard") e da tarde ("Vibrato"), mas mesmo admitindo que neles foi possível ouvir algo da vastíssima obra de Fernando Lopes-Graça, mais podia e devia a Antena 2 fazer no turno da noite, resgatando do arquivo histórico um documentário biográfico, e/ou um programa de autor sobre o compositor e/ou uma entrevista. Nada disso aconteceu, deploravelmente, e aí a responsabilidade é inteirinha da direcção de programas que, uma vez mais, pecou por omissão.
Se Helena apartar
Poema (vilancete em redondilha menor): Luís de Camões (in "Rimas", org. Estêvão Lopes, Lisboa, 1598; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – 806-807)
Música: Fernando Lopes-Graça (1.ª peça do ciclo "Quatro Redondilhas de Camões", Op. 76, LG 22, 1951-53)
Intérprete: Coro Gulbenkian*, dir. Jorge Matta (in CD "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", PortugalSom/Numérica, 2008)
MOTE
Se Helena apartar
do campo seus olhos,
nascerão abrolhos.
VOLTAS
A verdura amena,
gados, que pasceis,
sabei que a deveis
aos olhos de Helena.
Os ventos serena,
faz flores de abrolhos
o ar de seus olhos.
Faz serras floridas,
faz claras as fontes:
se isto faz nos montes,
que fará nas vidas?
Trá-las suspendidas,
como ervas em molhos,
na luz dos seus olhos.
Os corações prende
com graça inumana;
de cada pestana
uma alma lhe pende.
Amor se lhe rende
e, posto em geolhos,
pasma nos seus olhos.
Notas:
abrolhos – plantas herbáceas, de fruto espinhoso, que crescem nos terrenos incultos da região mediterrânica;
pasceis – pastais;
inumana – sobre-humana, divina;
Amor – Eros/Cupido (deus do amor);
geolhos – joelhos.
Falso cavaleiro ingrato
Poema (cantiga em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Fernão Rodrigues Lobo Soropita, Lisboa, 1595; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 777-778)
Música: Fernando Lopes-Graça (2.ª peça do ciclo "Quatro Redondilhas de Camões", Op. 76, LG 22, 1951-53)
Intérprete: Coro Gulbenkian*, dir. Jorge Matta (in CD "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", PortugalSom/Numérica, 2008)
CANTIGA VELHA
Falso cavaleiro ingrato,
enganais-me;
vós dizeis que vos eu mato,
e vós matais-me.
VOLTAS
Costumadas artes são
para enganar inocências,
piadosas aparências
sobre isento coração.
Eu vos amo, e vós, ingrato,
magoais-me,
dizendo que vos eu mato,
e vós matais-me.
Vede agora qual de nós
anda mais perto do fim,
que a justiça faz-se em mim
e o pregão diz que sois vós.
Quando mais verdade trato,
levantais-me
que vos desamo e vos mato,
e vós matais-me.
Tende-me mão nele
Poema (vilancete em redondilha menor): Luís de Camões (in "Rimas", org. Estêvão Lopes, Lisboa, 1598; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 810-811)
Música: Fernando Lopes-Graça (3.ª peça do ciclo "Quatro Redondilhas de Camões", Op. 76, LG 22, 1951-53)
Intérprete: Coro Gulbenkian*, dir. Jorge Matta (in CD "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", PortugalSom/Numérica, 2008)
MOTE ALHEIO
Tende-me mão nele,
que um real me deve.
VOLTAS
C'um real de amor
dous de confiança
e três de esperança
me foge o tredor.
Falso desamor
se encerra naquele
que um real me deve.
Pediu-mo emprestado,
não lhe quis penhor;
é mau pagador,
tendo-me aferrado.
C'um cordel atado
ao Tronco se leve,
que um real me deve.
Por esta travessa
se vai acolhendo;
ei-lo vai correndo,
fugindo a grã pressa.
Nesta mão e nessa
o falso se atreve,
que um real me deve.
Comprou-me amor
sem lhe fazer preço:
eu não lhe mereço
dar-me desfavor.
Dá-me tanta dor
que ando após ele
pelo que me deve.
Eu de cá bradando,
ele vai fugindo;
ele sempre rindo,
eu sempre chorando.
De quando em quando
no amor se atreve,
como que não deve.
A falar verdade,
ele já pagou;
mas inda ficou
devendo ametade.
Minha liberdade
é a que me deve;
só nela se atreve.
Verdes são os campos
Poema (cantiga em redondilha menor): Luís de Camões (in "Rimas", org. Estêvão Lopes, Lisboa, 1598; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 807-808)
Música: Fernando Lopes-Graça (4.ª peça do ciclo "Quatro Redondilhas de Camões", Op. 76, LG 22, 1951-53)
Intérprete: Coro Gulbenkian*, dir. Jorge Matta (in CD "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", PortugalSom/Numérica, 2008)
MOTE ALHEIO
Verdes são os campos,
de cor de limão:
assim são os olhos
do meu coração.
VOLTAS
Campo, que te estendes
com verdura bela;
ovelhas, que nela
vosso pasto tendes,
de ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gados, que pasceis,
co contentamento,
vosso mantimento
não no entendeis:
isso que comeis
não são ervas, não:
são graças dos olhos
do meu coração.
* Coro Gulbenkian (naipes femininos):
Sopranos – Clara Coelho (solista em "Tende-me mão nele"), Graziela Lé (solista em "Tende-me mão nele"), Marisa Figueira (solista em "Tende-me mão nele"), Mónica Santos (solista em "Se Helena apartar"), Rosa Caldeira (solista em "Se Helena apartar" e "Verdes são os campos")
Susana Duarte (solista em "Verdes são os campos"), Teresa Azevedo, Verónica Silva
Contraltos – Catarina Saraiva, Inês Martins, Mafalda Borges Coelho, Manon Marques (solista em "Tende-me mão nele"), Michelle Rollin (solista em "Falso cavaleiro ingrato" e "Tende-me mão nele"), Patrícia Mendes (solista em "Se Helena apartar"), Tânia Valente (solista em "Tende-me mão nele")
Direcção – Jorge Matta
Produção musical – Sérgio Fontão
Produção – PortugalSom - Ministário da Cultura / Direcção-Geral das Artes
Gravado no Grande Auditório da sede da Fundação Gulbenkian, Lisboa, por Numérica, Lda.
Gravação, editing e misturas – João Nuno Silva
URL: https://gulbenkian.pt/musica/coro-e-orquestra/coro-gulbenkian/
https://www.meloteca.com/portfolio-item/coro-gulbenkian/
https://www.facebook.com/gulbenkianmusica/
https://music.youtube.com/channel/UCE3UnGOGRWjEj93WPvMzadw
Ojos, herido me habéis
Poema (vilancete em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Dom António Álvares da Cunha, Lisboa, 1668; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 839)
Música: Fernando Lopes-Graça (1.ª peça do ciclo "Três Líricas Castelhanas de Camões", Op. 96, LG 25, 1954-55)
Intérprete: Coro de Câmara de Lisboa*, dir. Teresita Gutierrez Marques (in CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", Numérica, 1999)
MOTE
Ojos, herido me habéis,
acabad ya de matarme;
mas muerto, volvé á mirarme
porque me resucitéis.
VOLTAS
Pues me distéis tal herida
con gana de darme muerte,
el morir me es dulce suerte,
pues con morir me dais vida.
¿Ojos, qué os detenéis?
Acabad ya de matarme;
mas muerto, volvé á mirarme,
porque me resucitéis.
La llaga cierto ya es mía,
aunque, ojos, vos no queráis;
mas si la muerte me dais,
el morir me es alegría.
Así, digo que acabéis,
ojos, de matarme;
mas muerto, volvé á mirarme,
porque me resucitéis.
De vuestros ojos centellas
Poema (vilancete em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Fernão Rodrigues Lobo Soropita, Lisboa, 1595; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 779-780)
Música: Fernando Lopes-Graça (2.ª peça do ciclo "Três Líricas Castelhanas de Camões", Op. 96, LG 25, 1954-55)
Intérprete: Coro de Câmara de Lisboa*, dir. Teresita Gutierrez Marques (in CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", Numérica, 1999)
MOTE ALHEIO
De vuestros ojos centellas
que encienden pechos de hielo,
suben por el aire al cielo
y en llegando son estrellas.
VOLTAS
Falsos loores os dan,
que esas centellas tan raras
no son nel cielo más claras
que en los ojos donde están.
Porque cuando miro en ellas
lo cómo alumbran al suelo
no sé qué serán nel cielo,
mas sé qué acá son estrellas.
Ni se puede presumir
que al cielo suban, Señora;
que la lumbre que en vos mora,
no tiene más que subir.
Mas pienso que dan querellas
a Dios nel octavo cielo,
porque son acá en el suelo
dos tan hermosas estrellas.
¿Do la mi ventura
Poema (vilancete em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Domingos Fernandes, Lisboa, 1616; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 816-817)
Música: Fernando Lopes-Graça (1.ª peça do ciclo "Três Líricas Castelhanas de Camões", Op. 96, LG 25, 1954-55)
Intérprete: Coro de Câmara de Lisboa*, dir. Teresita Gutierrez Marques (in CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", Numérica, 1999)
MOTE
¿Do la mi ventura,
que no veo alguna?
VOLTAS
Sepa quien padece,
que en la sepultura
se esconde ventura
de quien la merece.
Allá me parece
que quiere fortuna
que yo halle alguna.
Naciendo mezquino,
dolor fué mi cama;
tristeza fué el ama,
cuidado el padrino.
Vistióse el destino
negra vestidura,
huyó la ventura.
No se halló tormento
que allí no se hallase;
ni bien que pasase
sino como viento.
¡Oh qué nacimiento,
que luego en la cuna
me siguió Fortuna!
Esta dicha mía
que siempre busqué,
buscándola hallé
que no la hallaría;
que quien nace en día
de estrella tan dura,
nunca halla ventura.
No puso mi estrella
más ventura en min:
así vive en fin
quien nace sin ella;
quéjome que atura
vida tan escura.
* Coro de Câmara de Lisboa:
Sopranos – Jael Martins, Lucina Silva, Mafalda Nascimento, Matilde de Castro, Susana de Oliveira, Teresa Cordeiro
Contraltos – Ana Ferro, Isabel Torres, Luzia Rocha, Marta Gregório, Sílvia Fontão
Tenores – Aníbal Coutinho, Carlos Quintelas, José Pereira, Pedro Marques, Sérgio Fontão, Vítor Gonçalves
Baixos – António Marques, João Camacho, Jorge Leal, Marcelo Tusto, Pedro Figueira, Pedro Pires
Direcção – Teresita Gutierrez Marques
Produção – Teresita Gutierrez Marques, António Marques, Jorge Leal, Sérgio Fontão
Gravado na Igreja Anglicana de S. Jorge, Lisboa, em 1998
URL: https://corodecamaradelisboa.com/
https://www.meloteca.com/portfolio-item/coro-de-camara-de-lisboa/
https://www.facebook.com/corodecamaradelisboa/
https://www.youtube.com/@corodecamaradelisboa
https://www.youtube.com/@DoTempoDosSonhos/videos?query=coro+camara+lisboa
Capa do CD "Fernando Lopes-Graça: Música Coral", do Coro Gulbenkian, dir. Jorge Matta (PortugalSom/Numérica, 2008)
Concepção gráfica – Jorge Colombo
Capa do CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", do Coro de Câmara de Lisboa, dir. Teresita Gutierrez Marques (Numérica, 1999)
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Outros artigos com canções musicadas ou harmonizadas por Fernando Lopes-Graça:
A infância e a música portuguesa
A vitória do azeite
Celebrando Sophia de Mello Breyner Andresen
Celebrando Eugénio de Andrade
Camões recitado e cantado (VII)
Canções portuguesas de Natal harmonizadas/musicadas por Fernando Lopes-Graça
Camões recitado e cantado (VIII)
Eugénio de Andrade e Fernando Lopes-Graça: "Aquela Nuvem e Outras"
Camões recitado e cantado (IX)
Camões recitado e cantado (X)
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Outros artigos com poesia e/ou teatro de Luís de Camões:
Camões recitado e cantado
Camões recitado e cantado (II)
Em memória de Manoel de Oliveira (1908-2015)
Camões recitado e cantado (III)
Camões recitado e cantado (IV)
Camões recitado e cantado (V)
Camões recitado e cantado (VI)
Camões recitado e cantado (VII)
Camões recitado e cantado (VIII)
Camões recitado e cantado (IX)
Luís de Camões: "Os Lusíadas" (dois excertos), por Carlos Wallenstein
Luís Cília: "Se me Levam Águas" (Luís de Camões)
Teatro camoniano em versão radiofónica
Camões por Carmen Dolores
José Mário Branco: "Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades"
Camões recitado e cantado (X)
Camões evocado por Sophia
Luís de Camões: "Endechas a Bárbara Escrava"
Luís de Camões: "Perdigão perdeu a pena"
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