13 julho 2013

Queremos o "Lugar ao Sul" num horário decente!

Perante o horário esconso e indigno em que Rui Pêgo, em Janeiro de 2011, colocou o programa "Lugar ao Sul" na grelha da Antena 1 (às 7:00 da madrugada de sábado), e não estando eu disposto a sacrificar o meu merecido descanso depois de uma extenuante semana de trabalho, a gravação pré-programada tem sido o expediente usado para continuar a ouvir, a horas decentes (geralmente, depois das 09:00), as deliciosas conversas de Rafael Correia ilustradas com o melhor da música de Portugal. Ora ao pôr a tocar a gravação de hoje, apareceu-me não o "Lugar ao Sul" mas o José Candeias a conversar com camionistas. Disse para comigo: «Há aqui qualquer coisa de errado! Este indivíduo não estava entre as 05:00 e as 07:00 da madrugada, de segunda a sexta-feira?!». Fiquei a ouvir um pouco, apesar do desprazer, e pude então perceber que se tratava de uma colagem dos "melhores momentos" das emissões realizadas durante a semana. Fiz esta dedução: atendendo ao desdém que sempre nutriram pelo "Lugar ao Sul", e empenhados em dar mais visibilidade à falhada aposta em José Candeias para o crepúsculo matutino da Antena 1, Rui Pêgo e António Luís Marinho terão pensado que os admiradores da arte de Rafael Correia não se importariam com a troca. Pois se assim pensaram, estão redondamente enganados. O "Lugar ao Sul" não é um programa substituível por qualquer outro, por mais agradável de ouvir seja esse outro, que não é notoriamente o caso do espaço – banal e entediante q.b. – de José Candeias.
Na dúvida se o programa fora extinto ou transferido para outro horário, tratei de averiguar. Vim então a tomar conhecimento pela página do arquivo online que, embora não apresentando (inexplicavelmente) as edições após o dia 29 de Junho, o "Lugar ao Sul" desceu ainda mais para o escuro: 06:00 da madrugada! Como é possível?! Está-se mesmo a ver a intenção: reduzir o auditório, tradicionalmente bastante heterogéneo em termos de estratos sócio-económico-culturais, a uns quantos padeiros para depois, sem contestação, desferir sobre o programa o "golpe de misericórdia", com o argumento (hipócrita) de que deixou de ter audiência. Pérfido e revoltante!
Volto a afirmar, pela enésima vez: os srs. Rui Pêgo e António Luís Marinho têm todo o direito de não gostar do "Lugar ao Sul", embora isso seja difícil de compreender, tendo em conta o agrado que o programa sempre gerou no auditório da Antena 1 (e da RDP-Internacional) e os sucessivos elogios que recebeu de distintas personalidades, entre as quais os três anteriores Provedores do Ouvinte, mas não lhes assiste o direito de confundir os seus gostos pessoais com as funções directivas que lhes foram confiadas, que se devem reger pela máxima ponderação, equilíbrio e imparcialidade. A rádio pública não existe nem é financiada pelos cidadãos e empresas de Portugal para satisfazer o umbigo ou alimentar os caprichos de quem ocupa os cargos de chefia. Existe para prestar serviço público! Sendo o aclamado "Lugar ao Sul" um dos programas que melhor cumpre essa prerrogativa, aliando como nenhum outro no actual panorama radiofónico as componentes recreativa e cultural – por mérito exclusivo do seu autor – e constituindo o respectivo arquivo um fabuloso manancial de tesouros por explorar, não é admissível que seja tratado de modo tão indigno e humilhante. Os fiéis ouvintes e, bem assim, todas as pessoas dotadas de sensibilidade para apreciarem e desfrutarem de tão maravilhoso programa exigem respeito e jamais deixarão de clamar: «Queremos o "Lugar ao Sul" num horário decente!»



Adenda (em 05-Ago-2013):

O acervo de gravações do "Lugar ao Sul" existente no aquivo histórico da RDP, apesar da destruição (apagamento de bobines) que afectou sobretudo a década de 80, é de monta. Em meados de 2006, já ultrapassava 900 registos DAT. Contendo cada uma dessas unidades duas conversas (ou três, nos casos em que foi expurgado o preâmbulo musical), não andarei longe da verdade se disser que o total de conversas disponíveis, contabilizando também os três anos posteriores em que o programa teve edições originais (na Antena 1 e na Antena 2), ultrapassará os dois milhares. Perante tão extraordinária riqueza, que urge disponibilizar a quem a desejar usufruir, constitui um perfeito absurdo suspender tal resgate substituindo-o pela retransmissão das reedições, como tem acontecido nas últimas semanas. Faço minhas as palavras que o emérito jornalista Adelino Gomes, na qualidade de Provedor do Ouvinte, proferiu a respeito do "Lugar ao Sul", aquando do fim das emissões originais:
«Rafael Correia, 30 anos a encher as ondas radiofónicas de cenas da vida de pastores, artesãos, mourais, pescadores, varredores, salineiros, amoladores, bordadeiras. Uma legião de poetas, músicos, cantadores e cantadeiras, gente sábia, que como nunca outra teve um microfone e uma antena para a ouvir e até nós chegar. Há muitos anos, no jornal onde trabalhava ["Público"], escrevi um texto defendendo a obrigação da RTP de não apenas preservar a riqueza patrimonial de excepção representada pelos programas de Rafael Correia mas de a restituir aos portugueses [...]. Retomo este repto, agora como provedor e agora que "Lugar ao Sul" ameaça não voltar. Acho um crime de lesa-cultura se os programas forem deixados esquecidos e inúteis em pequenas cassetes DAT do arquivo histórico...»  (Adelino Gomes, Julho de 2009)


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