09 dezembro 2024

Celebrando Jorge Croner de Vasconcellos



VASCONCELLOS Moniz de Bettencourt, Jorge Croner de Sant'Anna e (n. Lisboa, 11 Abr. 1910; m. Lisboa, 9 Dez. 1974). Compositor, professor e pianista. Jorge Croner de Vasconcellos descende de uma família de músicos notáveis no âmbito da música erudita. O pai, Alexandre Bettencourt (1868-1945), eminente violinista, discípulo durante quatro anos em Paris do mestre Hubert Léonard, foi professor no Conservatório Nacional (classe de Violino). Mathilde das Nogueiras (1859-1941), irmã do pai, foi cantora de ópera de nomeada, tendo-se associado em Paris com a famosa Pauline Viardot-Garcia. A mãe, Laura Croner (1887-1962), violinista e pianista de talento, provinha de uma longa linhagem musical, começada em Portugal nos princípios do séc. XIX por Joseph Croner, músico germânico, cujos dois filhos — António José Croner (1826-1888) e Raphael José Croner (1828-1884), bisavô e tio-bisavô de Jorge Croner de Vasconcellos — foram concertistas notáveis, respectivamente na flauta e no clarinete. Cezaltina Croner (1864-?) e Regina Croner Cascais (1903-1982), filha e neta de Raphael, ambas pianistas, continuaram juntamente com Jorge Croner de Vasconcellos a linha musical até os nossos dias. Começando Solfejo e Piano com a mãe, Jorge Croner de Vasconcellos estudou depois Piano com Alexandre Rey Colaço e Composição com Luís de Freitas Branco, Francisco de Lacerda e Eduardo Libório, cursando contemporaneamente Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras (Universidade de Lisboa). Em 1934 recebeu da Junta de Educação Nacional uma bolsa para estudar em Paris, onde se manteve até ao Verão de 1937. Aí estudou Harmonia, Contraponto e História da Música com Nadia Boulanger; Composição, primeiro com Paul Dukas, depois com Roger Ducasse; Piano com Giraud-Latarse; Interpretação com Alfred Cortot. Beneficiou ainda dos ensinamentos de Igor Stravinski. Em 1938 foi nomeado professor interino de Composição do Conservatório Nacional, lugar que desempenhou até à morte. A obra de Jorge Croner de Vasconcellos cobre praticamente todos os géneros de música de câmara e sinfónica, exceptuando a ópera. Tecnicamente, caracteriza-se pelo relevo conferido à dissonância, como elemento estrutural e colorístico. Serviu-se com liberdade e discrição dos idiomas correntes antes do fim da II Guerra Mundial — modalismo, escala de tons inteiros, politonalismo, formação de acordes por sobreposição de intervalos diferentes da 3.ª.
Conservou da música tonal a ideia de centro tonal e de cadência, mas alargou aos 12 tons o conceito de tonalidade, e praticou cadências a intervalos diversos da 5.ª descendente ou 4.ª ascendente. Como Paul Hindemith, seu contemporâneo, procurou uma linguagem musical que superasse o cromatismo romântico herdado de Wagner e o atonalismo da Segunda Escola de Viena. Porém, o instinto meridional afastou-o dos sistemas intelectuais estanques. O seu estilo exibe variedade e vitalidade dos ritmos, opulência da harmonia e, em geral, elegância e concisão. Do ponto de vista expressivo, pode talvez sintetizar-se: um etos frequentemente melancólico; expressão directa da emoção; claridade e transparência da forma; capacidade de exprimir paixão, mas dificuldade na expressão da força; por vezes, franco sentido humorístico. Como professor, evitou o dogmatismo, tomou-se num guia experiente e seguro. A sua classe de Composição favoreceu a eclosão de personalidades as mais diversas, desde Constança Capdeville a Maria de Lourdes Martins, Armando Santiago, Filipe de Sousa, entre outros. Excelente pianista, quer como acompanhador quer a solo, abandonou a carreira de solista após 1943, por motivos de saúde.

              GIL MIRANDA
              (in "Enciclopédia da Música em Portugal
              no Século XX", Dir. Salwa Castelo-Branco,
              Lisboa: Temas e Debates/Círculo de
              Leitores, 2010 – Vol. IV, p. 1317)


OBRA

Canto e piano
(Publicação: Obras para Canto e Piano, Lisboa: Musicoteca, 1996)
- Três Redondilhas de Camões (1927):
          1. Descalça vai para a fonte
          2. Puz meus olhos numa funda
          3. Na fonte está Leonor
- Ciclo d'Antero [de Quental]: 5. No Turbilhão (1927)
- Senhora, partem tam tristes meus olhos [Joam Rodriguez de Castell Branco] (1936)
- Baylemos nos ia todas tres [Airas Nunes] (1936)
- En esta vida mortal [Diogo Brandão] (1937)
- Comigo me desavim [Francisco Sá de Miranda] (1938)
- O Viajante [Miguel Claro] (1944)
- Tenho barcos, tenho remos [Popular] (1945)
- Eu hei-de cantar bem alto [Popular] (1945)
- O adro tem quatro quinas [Popular] (1945)
- Ó alendroeiro [Popular] (1945)
- Canção [Afonso Lopes Vieira] (1948)
- Canção da almotolia [Afonso Lopes Vieira] (1948)
- Não: não digas nada! [Fernando Pessoa] (1950)
- Ao desconcerto do mundo [Luís de Camões] (1972)

Canto, flauta e quarteto de cordas
- Lembranças, tristes cuidados [Jorge de Resende] (1938)

Canto e órgão
- Erros meus, má fortuna, amor ardente [Luís de Camões] (1972)

Piano solo
(Publicação: Obras para Piano, Lisboa: Musicoteca, 1996)
- Peça para dois pianos (1930)
- Tocata a Carlos Seixas n.º 1 (1937)
- Scherzo (1937)
- Tocata a Carlos Seixas n.º 3 (1941)
- Trio da Tocata n.º 3 (1941)
- Tocata a Carlos Seixas n.º 2 (1942)
- Partita (1960)
- Canção (1973)

Coro a cappella
- Santa Cecília, Padroeira nossa (1935)
- Em Belém vila do amor [Gil Vicente] (1936)
- Formoso Tejo meu [Francisco Rodrigues Lobo] (1937)
- A formosura desta fresca serra [Luís de Camões] (1937)
- Oito Cantos do Natal [Popular] (1974)

Quarteto de cordas
- Rapsódia (1935)

Orquestra
Poemas sinfónicos
- Poemeto sinfónico [adaptação de texto de H.W. Longfellow] (1928)
- A Vela Vermelha [texto do Presidente da CML, António Vitorino da França Borges] (1961)

Bailados
- A Faina do Mar [texto próprio] (1936-37)
- A Lenda das Amendoeiras [Fernanda de Castro] (1940)
- Coimbra [adaptação de texto de Francis Graça] (1959)

Obra coral sinfónica
- Vilancico para a festa de Santa Cecília [adaptação do texto de dois vilancicos do século XVIII] (1967)

[https://www.bnportugal.gov.pt/images/stories/agenda/2010/jorge_croner_de_vasconcellos.pdf]


A obra musical de Jorge Croner de Vasconcellos, embora não seja vasta, inclui peças de tocante beleza e algumas delas são canções, a começar pelas maravilhosas "Três Redondilhas de Camões", musicadas em 1927, tinha então o compositor a jovem idade de 17 anos.
E é justamente com registos de canções que o celebramos na presente data, a pretexto do cinquentenário da morte, apresentando a integral para canto e piano (17 peças), na interpretação da soprano Ana Madalena Moreira e do pianista Lucjan Luc, seguida de "Lembranças, tristes cuidados", pelo João Roiz Ensemble e a soprano Marina Pacheco, e de "Fermoso Tejo meu", pelo Coro de Câmara de Lisboa, sob a direcção Teresita Gutierrez Marques. Neste conjunto pontifica alguma da melhor poesia portuguesa que a música de Jorge Croner de Vasconcellos serve admiravelmente elevando-a a um patamar de superior encantamento. Boa escuta e melhor fruição poético-musical!

Andámos, ao longo do dia, a 'picar' a emissão da Antena 2 (a escuta continuada seria um suplício, sobretudo por causa daquele autêntico flagelo que são os cartuchos de publicidade disparados ao virar de cada hora e também a seguir aos noticiários) e a única evocação de Jorge Croner de Vasconcellos que lográmos apanhar foi a feita por João Rodrigues Pedro, no espaço "Baile de Máscaras", com a leitura de uma resenha biográfica e a transmissão das já citadas "Três Redondilhas de Camões", cantadas por Ana Madalena Moreira, com acompanhamento ao piano pelo polaco Lucjan Luc. Enaltecemos o zelo e o profissionalismo de João Rodrigues Pedro, mas temos também de apontar o dedo acusador à direcção de programas por ter deixado passar a efeméride em vão. E se tal inacção é deveras reprovável, mais grave ainda é a inexistência na grelha de um espaço regular consagrado a compositores portugueses, e de uma rubrica reservada à canção erudita portuguesa. Esses espaços musicais de conceito editorial definido existiram durante o consulado de João Pereira Bastos, mas foram leviana e irresponsavelmente suprimidos. Resultado: Jorge Croner de Vasconcellos e tantos outros compositores nacionais, que são bastante negligenciados pelos animadores dos espaços alargados de música a esmo, deixaram de ter cabal e conveniente divulgação na rádio que tem como missão (primeira) divulgar a música portuguesa.



Descalça vai para a fonte



Poema (vilancete em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Dom António Álvares da Cunha, Lisboa, 1668; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 834-835)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos ("Três Redondilhas de Camões", N.º 1, 1927)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)




          MOTE

Descalça vai para a fonte
Leonor pela verdura;
vai formosa, e não segura.

          VOLTAS

Leva na cabeça o pote,
o testo nas mãos de prata,
cinta de fina escarlata,
sainho de chamalote;
traz a vasquinha de cote,
mais branca que a neve pura;
vai formosa, e não segura.

Descobre a touca a garganta,
cabelos d'ouro trançado,
fita de cor de encarnado...
tão linda que o mundo espanta!
Chove nela graça tanta,
que dá graça à formosura;
vai formosa, e não segura. [bis]


Notas:
escarlata – tecido de lã de cor vermelha muito viva;
sainho – casaco curto que se vestia por cima da blusa;
chamalote – tecido de pêlo ou lã geralmente com seda, talvez assemelhando-se ao actual cetim;
vasquinha – saia com muitas pregas em volta da cintura;
de cote – de uso quotidiano.

* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Puz meus olhos numa funda



Poema (cantiga em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Fernão Rodrigues Lobo Soropita, Lisboa, 1595; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 770)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos ("Três Redondilhas de Camões", N.º 2, 1927)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


          MOTE

Pus meus olhos numa funda,
e fiz um tiro com ela
às grades duma janela. [bis]

          VOLTA

Uma dama, de malvada,
tomou seus olhos na mão,
e tirou-me uma pedrada
com eles ao coração.
Armei minha funda então,
e pus os meus olhos nela:
trape! quebrei-lhe a janela.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Na fonte está Leonor



Poema (vilancete em redondilha maior): Luís de Camões (in "Rimas", org. Domingos Fernandes, Lisboa, 1616; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 812-813)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos ("Três Redondilhas de Camões", N.º 3, 1927)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


          CANTIGA ALHEIA

Na fonte está Leonor
lavando a talha e chorando,
às amigas perguntando:
— Vistes lá o meu amor?

          VOLTAS

Posto o pensamento nele,
porque a tudo o amor obriga,
cantava, mas a cantiga
eram suspiros por ele.
Nisto estava Leonor
o seu desejo enganando,
às amigas perguntando:
— Vistes lá o meu amor?

O rosto sobre uma mão,
os olhos no chão pregados,
que, de chorar já cansados,
algum descanso lhe dão.
Desta sorte Leonor
suspende de quando em quando
sua dor; e, em si tornando,
mais pesada sente a dor.

Não deita dos olhos água,
que não quer que a dor se abrande
amor, porque, em mágoa grande,
seca as lágrimas a mágoa.
Despois que de seu amor
soube, novas perguntando,
de improviso a vi chorando.
Olhai que extremos de dor!


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



No Turbilhão



Poema: Antero de Quental ("Os Sonetos Completos de Anthero de Quental", publicados por J. P. Oliveira Martins, Porto: Livraria Portuense de Lopes & C.ª Editores, 1886 – p. 92; "Antero de Quental: Sonetos", Ed. organizada, prefaciada e anotada por António Sérgio, Col. Clássicos Sá da Costa, Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 6.ª edição, 1979 – p. 89; "Antero de Quental: Poesia Completa", Org. e pref. Fernando Pinto do Amaral, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2001 – p. 288-289)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1927)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


                               (A Jayme Batalha Reis)

No meu sonho desfilam as visões,
Espectros dos meus próprios pensamentos,
Como um bando levado pelos ventos,
Arrebatado em vastos turbilhões...

Numa espiral, de estranhas contorções,
E donde saem gritos e lamentos,
Vejo-os passar, em grupos nevoentos,
Distingo-lhes, a espaços, as feições...

— Fantasmas de mim mesmo e da minha alma,
Que me fitais com formidável calma,
Levados na onda turba do escarcéu,

Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes?
Quem sois, visões misérrimas e atrozes?
Ai de mim! ai de mim! e quem sou eu?!...


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Senhora, partem tam tristes meus olhos



Poema: Joam Rodriguez de Castell Branco (in "Cancioneiro Geral", ordenado e emendado por Garcia de Resende, Almeirim/Lisboa: Hermã de Cãpos, 1516 – f. 107v; "Cancioneiro Geral de Garcia de Resende", Fixação do texto e estudo por Aida Fernanda Dias, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990-2003 – Vol. II, p. 324, poema n.º 396)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1936)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d'esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Baylemos nos ia todas tres



Poema [Cantiga de amigo (bailada)]: Airas Nunes (Séc. XIII, in "Cancioneiro da Biblioteca Nacional", B 879 – f. 186r / "Cancioneiro da Vaticana", V 462 – f. 73v; "500 Cantigas d'Amigo", Ed. crítica de Rip Cohen, Col. Obras Clássicas da Literatura Portuguesa, Porto: Campo das letras, 2002 – p. 317)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1936)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Baylemos nos ia todas tres, ay amigas,
so aquestas avelaneyras frolidas,
e quen for velida, como nos, velidas,
se amigo amar,
so aquestas avelaneyras frolidas
verrá baylar.

Baylemos nos ia todas tres, ay irmanas,
so aqueste ramo destas avelanas,
e quen for louçana, como nos, louçanas,
se amigo amar,
so aqueste ramo destas avelanas
verrá baylar.

Por Deus, ay amigas, mentr'al non fazemos
so aqueste ramo frolido bailemos,
e quen ben parecer, como nos parecemos,
se amigo amar,
so aqueste ramo, sol que nos baylemos,
verrá baylar.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



En esta vida mortal



Poema: Diogo Brandão (in "Cancioneiro Geral", ordenado e emendado por Garcia de Resende, Almeirim/Lisboa: Hermã de Cãpos, 1516 – f. 94v; "Cancioneiro Geral de Garcia de Resende", Fixação do texto e estudo por Aida Fernanda Dias, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990-2003 – Vol. II, p. 238, poema n.º 350)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1937)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


En esta vida mortal
nom ha hy prazer que dure,
nem menos tamanho mal
que por tempo se nam cure.

Assi bem aventurados
casos, bem acontecidos,
como outros desastrados,
tam cedo como passados,
sam de todo esquecidos.
É uma regra geral
nam haver hy bem que dure,
nem menos tamanho mal
que por tempo se nam cure.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Comigo me desavim



Poema: Francisco Sá de Miranda (in "Cancioneiro Geral", ordenado e emendado por Garcia de Resende, Almeirim/Lisboa: Hermã de Cãpos, 1516 – f. 109v; "Cancioneiro Geral de Garcia de Resende", Fixação do texto e estudo por Aida Fernanda Dias, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990-2003 – Vol. II, p. 338, poema n.º 415)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1938)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Comigo me desavim,
Vejo-m'em grande perigo,
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.

Antes qu'este mal tivesse,
da outra gente fugia;
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.
Que cabo espero ou que fim
deste cuidado que sigo,
pois trago a mim comigo
tamanho imigo de mim?

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



O Viajante



Poema: Miguel Claro (pseudónimo de Eduardo Miguel Monteiro Libório, 1900-1946) (in "Eduardo Libório: Poesias, Desenhos e Correspondência", Pref., introd., org. e notas de Gil Miranda, Col. Arte e Artistas, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2010 – p. 65)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1944)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Gosto tanto de sonhar
E de dormir...
Esquecer o tempo que passou
E não pensar no que há-de vir...
Viver a vida verdadeira
A noute inteira:
Fechar os olhos, e partir...

Tudo em silêncio, tudo apagado,
E eu suspenso
Maravilhado,
A espreitar para o que está do outro lado...

Se me esquecesse de voltar...
Oh! Se pudesse ficar assim,
Horas sem fim,
Sem acordar,
A viajar dentro de mim...


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Tenho barcos, tenho remos



Letra e música: Popular
Harmonização: Jorge Croner de Vasconcellos (1945)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Tenho barcos, tenho remos,
Tenho navios no mar;
Tenho um amor tão bonito,
Olé, menina, olé!
Não me deixam namorar.

Tenho barcos, tenho remos,
Tenho navios no mar;
Tenho um amor tão bonito,
Olé, menina, olé!
Não me deixam namorar.

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



O adro tem quatro quinas



Letra e música: Popular
Harmonização: Jorge Croner de Vasconcellos (1945)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Ai, o adro tem quatro quinas, [bis]
Também tem cinco janelas;
Ó ai, ó larilóló!

Ai, também tem cinco meninas; [bis]
Quem me dera uma delas!
Ó ai, ó larilóló!

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Eu hei-de cantar bem alto



Letra e música: Popular
Harmonização: Jorge Croner de Vasconcellos (1945)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Eu hei-de cantar bem alto, [bis]
Ai, quem dormir há-de acordar; [bis]
Ailarai ó lariloléla!
Ailarai ó larilóló!

Só a mãe do meu amor [bis]
Ai, a dormir há-de ficar. [bis]
Ailarai ó lariloléla!
Ailarai ó larilóló!

Menina qu'estás à janela, [bis]
Ai, encostada à vidraça... [bis]
Ailarai ó lariloléla!
Ailarai ó larilóló!

Tem nariz de perdigueiro, [bis]
Ai, venha comigo pr'à caça! [bis]
Ailarai ó lariloléla!
Ailarai ó larilóló!

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Ó alendroeiro



Letra e música: Popular
Harmonização: Jorge Croner de Vasconcellos (1945)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Ó alendroeiro,
onde está teu lendroal?
Teu amor primeiro
foi meu rival.

Nossa Senhora é mãe,
é mãe de quem mãe não tem;
Quando minha mãe morrer,
será minha mãe também.

Ó alendroeiro,
onde está teu lendroal?
Teu amor primeiro
foi meu rival.

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Canção



Poema: Afonso Lopes Vieira (De "Saudade e Amor", in "Os Versos de Afonso Lopes Vieira", Lisboa: Sociedade Editora Portugal-Brasil, 1927 – p. 265-266; "Afonso Lopes Vieira: Antologia Poética", Escolha e comentário de Nuno Sampayo, Col. Poesia e Verdade, Lisboa: Guimarães Editores, 1966 – p. 126)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1948)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Nesta hora o meu desejo
co'as nuvens lilazes vai...
O dia morre num beijo,
o beijo morre num ai.

Oh nuvens de este sol-pôr,
saudades assemelhando,
sois um raminho que eu mando
cá de longe ao meu amor.

[instrumental]


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Canção da Almotolia



Poema: Afonso Lopes Vieira (De "Cancioneiro – I", in "Os Versos de Afonso Lopes Vieira", Lisboa: Sociedade Editora Portugal-Brasil, 1927 – p. 213)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1948)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


[instrumental]

Em casa do cavador
vinho é o pranto, pão é a dor.

Só há um regalo à mesa
depois do cansado dia:
tempera a ceia à pobreza
o azeite da almotolia.

Foi feita da mesma terra
que eles cavaram,
e oleiros pobres vidraram
o vaso que a mesa alegra.

Que, em casa do cavador,
vinho é o pranto, pão é a dor.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Não: não digas nada!



Poema: Fernando Pessoa (in "Poesias de Fernando Pessoa", Col. Obras Completas de Fernando Pessoa, Vol. I, Lisboa: Edições Ática, 1942, 14.ª edição, 1993 – p. 132)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1950)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Não: não digas nada!
Supor o que dirá
A tua boca velada
É ouvi-lo já.

É ouvi-lo melhor
Do que o dirias.
O que és não vem à flor
Das frases e dos dias.

És melhor do que tu.
Não digas nada; sê!
Graça do corpo nu
Que invisível se vê.

             5/6-2-1931


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano



Ao desconcerto do Mundo



Poema (esparsa em redondilha maior): Luís de Camões (ligeiramente adaptado) [texto original >> abaixo]
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1972)
Intérpretes: Ana Madalena Moreira* & Lucjan Luc (in CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", Numérica, 2001)


Os bons vi sempre passar
no mundo graves tormentos;
e, para mais me espantar,
os maus vi sempre nadar
em mar de contentamentos.
Cuidando de alcançar assim
o bem tão mal ordenado,
fui mau, mas fui castigado:
assim que, só para mim
anda o Mundo concertado.

[instrumental]

Os bons vi sempre passar
no mundo graves tormentos;
e, para mais me espantar,
os maus vi sempre nadar
em mar de contentamentos.


* Ana Madalena Moreira – voz (soprano)
Lucjan Luc – piano (Yamaha CFIII – Grand piano)

Coordenação de produção – Ilídio Moreira
Produção executiva – Fernando Rocha
Gravado, editado e masterizado no Aurastudio, Paços de Brandão (Santa Maria da Feira), em Junho de 1999, por Jorge Fidalgo
URL: https://anamadalenamoreira.weebly.com/
https://www.meloteca.com/portfolio-item/ana-madalena-moreira/
https://anamadalenamoreira.blogspot.com/
https://www.facebook.com/anamrlmoreira
https://www.youtube.com/@anamoreira8323/videos
https://music.youtube.com/channel/UC3HMmYTloa2oBd1_RI70UNg



Ao desconcerto do Mundo

(Luís de Camões, in "Rimas", org. Estêvão Lopes, Lisboa, 1598; "Obras de Luís de Camões", Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 801)


Os bons vi sempre passar
no mundo graves tormentos;
e, para mais me espantar,
os maus vi sempre nadar
em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
o bem tão mal ordenado,
fui mau, mas fui castigado:
assim que, só para mim
anda o Mundo concertado.



Lembranças, tristes cuidados



Poema: Jorge de Resende (in "Cancioneiro Geral", ordenado e emendado por Garcia de Resende, Almeirim/Lisboa: Hermã de Cãpos, 1516 – f. 186v; "Cancioneiro Geral de Garcia de Resende", Fixação do texto e estudo por Aida Fernanda Dias, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990-2003 – Vol. IV, p. 31, poema n.º 664)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1938)
Intérpretes: João Roiz Ensemble* & Marina Pacheco (in CD "Cantiga Partindo-se", Câmara Municipal de Castelo Branco, 2017)




[instrumental]

Lembranças, tristes cuidados
magoam meu coração,
quando cuido nos passados
dias que passados são.

Que a vida me custasse
todo outro padecer,
folgaria de sofrer
se o passado não lembrasse,
mas por que sejam dobrados
meus males mais do que são,
cuido sempre em bens passados,
que perdi bem sem razão.

[instrumental]


* João Roiz Ensemble:
Vasken Fermanian – violino
João Mendes – violino
João Pedro Delgado – viola de arco
Ricardo Mota – violoncelo
Manuel Luís Cochofel – flauta transversal
Marina Pacheco – voz (soprano)

Captação, edição e masterização – Luís Marques (United Studios Multimedia Collective)
URL: https://www.facebook.com/ensemblejoaoroiz/
https://www.youtube.com/@joaoroiz1710/videos
https://www.youtube.com/playlist?list=PLuUD9dzjdhkN3EPY3sRbfzhdrpzHqAp6i



Fermoso Tejo meu



Poema: Francisco Rodrigues Lobo (in "Poesias de Francisco Rodrigues Lobo", Selecção, pref. e notas de Afonso Lopes Vieira, Col. Clássicos Sá da Costa, Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1940 – p. 83)
Música: Jorge Croner de Vasconcellos (1937)
Intérpretes: Coro de Câmara de Lisboa*, dir. Teresita Gutierrez Marques (in CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", Numérica, 1999)


Fermoso Tejo meu, quão diferente
Te vejo e vi, me vês agora e viste:
Turvo te vejo a ti, tu a mim triste,
Claro te vi eu já, tu a mim contente.

A ti foi-te trocando a grossa enchente
A quem teu largo campo não resiste;
A mim trocou-me a vista em que consiste
O meu viver contente ou descontente.

Já que somos no mal participantes,
Sejamo-lo no bem. Oh! quem me dera
Que fossemos em tudo semelhantes!

Mas lá virá então a fresca primavera:
Tu tornarás a ser quem eras d'antes,
Eu não sei se serei quem d'antes era.


* Coro de Câmara de Lisboa:
Sopranos – Jael Martins, Lucina Silva, Mafalda Nascimento, Matilde de Castro, Susana de Oliveira, Teresa Cordeiro
Contraltos – Ana Ferro, Isabel Torres, Luzia Rocha, Marta Gregório, Sílvia Fontão
Tenores – Aníbal Coutinho, Carlos Quintelas, José Pereira, Pedro Marques, Sérgio Fontão, Vítor Gonçalves
Baixos – António Marques, João Camacho, Jorge Leal, Marcelo Tusto, Pedro Figueira, Pedro Pires
Direcção – Teresita Gutierrez Marques

Produção – Teresita Gutierrez Marques, António Marques, Jorge Leal, Sérgio Fontão
Gravado na Igreja Anglicana de S. Jorge, Lisboa, em 1998
URL: https://corodecamaradelisboa.com/
https://www.meloteca.com/portfolio-item/coro-de-camara-de-lisboa/
https://www.facebook.com/corodecamaradelisboa/
https://www.youtube.com/@corodecamaradelisboa
https://www.youtube.com/@DoTempoDosSonhos/videos?query=coro+camara+lisboa



Ana Madalena Moreira, soprano



Lucjan Luc, pianista (polaco)



Marina Pacheco, soprano



Teresita Gutierrez Marques, maestrina (filipina)
Fotografia – Carlos Santos



Capa do CD "Croner de Vasconcellos, Ivo Cruz, Vianna da Motta", de Ana Madalena Moreira & Lucjan Luc (Numérica, 2001)
Fotografia – Fernando Rocha
Design – Numérica



Capa do CD "Cantiga Partindo-se", de João Roiz Ensemble (Câmara Municipal de Castelo Branco, Fev. 2017)
Concepção – Jorge Portugal Design



Capa do CD "Música Coral Portuguesa do Século XX", do Coro de Câmara de Lisboa, dir. Teresita Gutierrez Marques (Numérica, 1999)



Capa do livro "Jorge Croner de Vasconcellos: Vida e Obra Musical", de Gil Miranda (Lisboa: Musicoteca, 1992)

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