21 março 2015
Al-Mu'tamid: "Evocação de Silves"
No Dia Mundial da Poesia, e estando a assinalar-se os 920 anos da morte de um dos mais insignes poetas do Al-Andalus, Al-Mu'tamid, apresentamos aquele que é, muito possivelmente, o seu poema mais conhecido, "Evocação de Silves", em três traduções e em quatro registos fonográficos. Todos eles, excepto o mais recente (editado no presente mês de Março), foram dados a descobrir a muitos ouvintes da Antena 1 (neles se incluindo o escrevente destas linhas) pela mão de Rafael Correia, no seu maravilhoso "Lugar ao Sul". A exemplo, aliás, do que aconteceu com bastantes mais gravações discográficas de poesia erudita (recitada ou cantada), que nunca figuraram noutros programas da rádio pública. Nesta conformidade, cumpre-nos chamar a atenção da nova administração da Rádio e Televisão de Portugal para a importância de o fabuloso arquivo do "Lugar ao Sul" ser resgatado ao silêncio e posto ao alcance dos ouvidos do público que o deseje fruir.
Evocação de Silves
Poema de Al-Mu'tamid; trad. António Borges Coelho (in "Portugal na Espanha Árabe": Vol. IV – Secção "Poetas e Prosadores do Garbe Al-Andalus", Col. Paralelos, Lisboa: Seara Nova, 1975 – p. 300-301; "Portugal na Espanha Árabe": Vol. I – "Geografia e Cultura", Lisboa: Editorial Caminho, 1989; "Portugal na Espanha Árabe", 3.ª edição revista, Lisboa: Editorial Caminho, 2008 – p. 510-511), a partir da tradução espanhola de Emilio García Gómez (in "Poemas Arabigoandaluces", Madrid: Editorial Plutarco, 1930)
Recitado por Afonso Dias / Trupe Barlaventina* (in CD "Lendas do País do Sul", Concertante, 1999)
Apoio musical: Klasik Türk Müzigi
Eia, Abú Bacre, saúda os meus lares em Silves e pergunta-lhes
se, como penso, ainda se recordam de mim.
Saúda o Palácio das Varandas da parte de um donzel
que sente perpétua saudade daquele alcácer.
Ali moravam guerreiros como leões e brancas gazelas.
E em que belas selvas e em que belos covis!
Quantas noites passei divertindo-me à sua sombra
com mulheres de cadeiras opulentas e talhe fatigado,
brancas e morenas, que produziam na minha alma
o efeito das espadas refulgentes e das lanças obscuras!
Quantas noites passei, deliciosamente, junto a um recôncavo do rio
com uma donzela cuja pulseira rivalizava com a curva da corrente!
O tempo passava e ela servia-me o vinho do seu olhar
e outras vezes o do seu vaso e outras o da sua boca.
As cordas do seu alaúde, feridas pelo plectro, estremeciam-me
como se ouvisse a melodia das espadas nos tendões do colo inimigo.
Ao retirar o seu manto, descobriu o talhe, florescente ramo de salgueiro,
como se abre o botão para mostrar a flor.
Nota: Abú Bacre Ibn Ammar, também ele um distinto poeta, era amigo dilecto de Al-Mu'tamid, a quem sucedeu como governador de Silves, quando este subiu ao trono da taifa de Sevilha.
* Afonso Dias – voz
Arranjos e direcção musical – Trupe Barlaventina (Afonso Dias, Carla Moreira, Luís de Abreu e Pedro Glória)
Gravado no Estúdio InforArte, Lagos
Técnicos de som – Fernando Guerreiro e Joaquim Guerreiro
Saudação a Silves
Poema de Al-Mu'tamid; trad. Mário Guerra Roque (in "História Luso-Árabe: Episódios e Figuras Meridionais", de Garcia Domingues, Lisboa: Empresa Editora Pro-Domo, 1945 – p. 147-148; 2.ª edição, Silves: Centro de Estudos Luso-Árabes de Silves, 2010 – p. 147-148), a partir da tradução espanhola de Emilio García Gómez (in "Poemas Arabigoandaluces", Madrid: Editorial Plutarco, 1930)
Recitado por António Baeta de Oliveira (in CD "Andalusino", de Eduardo Ramos*, InforArte, 1999)
Música: Eduardo Ramos
Eia, Abu Bacre! Saúda os meus lares, em Silves,
E pergunta-lhes se guardam memória de mim, como penso.
Saúda o Xarajibe da parte de um donzel
Que perpetuamente suspira por esse palácio.
Morada de leões e de brancas gazelas
Que ora parece um covil, ora um gineceu!
Quantas tardes passei deliciado à sua sombra,
Com mulheres de ancas largas, cintura delicada,
Umas brancas, outras morenas que faziam em mim
O efeito de espadas refulgentes ou de lanças escuras!
E a noite deliciosamente passada, junto do açude do rio,
Com a donzela cuja pulseira semelhava a curva da corrente...
E ela continuamente me embriagava, ora com o vinho do seu olhar,
Ora com o da sua taça, ora com o da sua boca.
E as cordas do alaúde, feridas pelo plectro, faziam-me estremecer
Como se sentisse melodias de espadas nos tendões do colo do inimigo.
E ao deixar cair o manto, descobria o seu corpo...
Era um ramo de salgueiro brilhante,
Como quando do botão surge a flor!
* António Baeta de Oliveira – voz
Eduardo Ramos – alaúde árabe
Gravado no Estúdio InforArte, Lagos, de Abril a Junho de 1999
Técnicos de som – Joaquim Guerreiro e Fernando Guerreiro
Misturas – Joaquim Guerreiro, Fernando Guerreiro, Eduardo Ramos e Tiago Ramos
Evocação de Silves
Poema: Al-Mu'tamid; trad. Adalberto Alves (in "O Meu Coração É Árabe: A Poesia Luso-Árabe", Lisboa: Assírio & Alvim, 1987; 3.ª edição revista e aumentada, Lisboa: Assírio & Alvim, 1999 – p. 242-243; "Al-Mu'tamid: Poeta do Destino", Lisboa: Assírio & Alvim, 1996; 2.ª edição revista e aumentada, Lisboa: Assírio & Alvim, 2004)
Música: Eduardo Ramos
Intérprete: Eduardo Ramos* (in CD "Cântico para Al-Mu'tamid", Eduardo Ramos, 2005)
Saúda, por mim, Abû Bakr,
os queridos lugares de Silves
e diz-me se deles a saudade
é tão grande quanto a minha.
Saúda o Palácio dos Balcões,
da parte de quem nunca o esqueceu,
morada de leões e de gazelas
salas e sombras onde eu
doce refúgio encontrava
entre ancas opulentas
e tão estreitas cinturas.
Moças níveas e morenas
atravessavam-me a alma
como brancas espadas,
como lanças escuras.
Ai quantas noites fiquei,
lá no remanso do rio,
preso nos jogos do amor
com a da pulseira curva,
igual aos meandros da água,
enquanto o tempo passava...
ela me servia vinho:
o vinho do seu olhar,
às vezes o do seu copo,
e outras vezes o da boca.
Tangia-me o alaúde
e eis que eu estremecia
como se estivesse ouvindo
tendões de colos cortados.
Mas se retirava as vestes
grácil detalhe mostrando,
era ramo de salgueiro
que me abria o seu botão
para ostentar a flor.
* Eduardo Ramos – alaúde árabe e declamação
Gravado, misturado e masterizado no Estúdio InforArte, Lagos, nos dias 7 e 8 de Maio de 2005
Técnicos de som – Fernando Guerreiro e Joaquim Guerreiro
Misturas – Eduardo Ramos e Fernando Guerreiro
Evocação de Silves
Poema de Al-Mu'tamid; trad. António Borges Coelho (in "Portugal na Espanha Árabe": Vol. IV – Secção "Poetas e Prosadores do Garbe Al-Andalus", Col. Paralelos, Lisboa: Seara Nova, 1975 – p. 300-301; "Portugal na Espanha Árabe": Vol. I – "Geografia e Cultura", Lisboa: Editorial Caminho, 1989; "Portugal na Espanha Árabe", 3.ª edição revista, Lisboa: Editorial Caminho, 2008 – p. 510-511), a partir da tradução espanhola de Emilio García Gómez (in "Poemas Arabigoandaluces", Madrid: Editorial Plutarco, 1930)
Música: Janita Salomé
Arranjo: Filipe Raposo
Intérprete: Janita Salomé* (in CD "Al-Mu'tamid: Poeta Rei do Al-Andalus", AMG Music/Carlos Gomes/Sony Music, 2015)
Eia, Abú Bacre, saúda os meus lares em Silves e pergunta-lhes
se, como penso, ainda se recordam de mim.
Saúda o Palácio das Varandas da parte de um donzel
que sente perpétua saudade daquele alcácer.
Ali moravam guerreiros como leões e brancas gazelas.
E em que belas selvas e em que belos covis!
Quantas noites passei divertindo-me à sua sombra
com mulheres de cadeiras opulentas e talhe fatigado,
brancas e morenas, que produziam na minha alma
o efeito das espadas refulgentes e das lanças obscuras!
Quantas noites passei, deliciosamente, junto a um recôncavo do rio
com uma donzela cuja pulseira rivalizava com a curva da corrente!
O tempo passava e ela servia-me o vinho do seu olhar
e outras vezes o do seu vaso e outras o da sua boca.
As cordas do seu alaúde, feridas pelo plectro, estremeciam-me
como se ouvisse a melodia das espadas nos tendões do colo inimigo.
Ao retirar o seu manto, descobriu o talhe, florescente ramo de salgueiro,
como se abre o botão para mostrar a flor.
* [Créditos gerais do disco:]
Filipe Raposo – piano
Eduardo Paniagua – saltério e flautas
Janita Salomé – voz e percussão
El Arabí Serghini – voz e percussão
Cesar Carazo – voz e fídula
Jamal Ben Allal – violino
Joaquim Teles – percussão
Direcção musical – Filipe Raposo
Concepção e direcção artística – Carlos Gomes
Produção – AMG Music / Carlos Gomes
Captação áudio, mistura e masterização – Hélder Nelson
Capa do livro "Portugal na Espanha Árabe: Vol. IV", de António Borges Coelho (Seara Nova, 1975)
Capa do livro "Portugal na Espanha Árabe", de António Borges Coelho, 3.ª edição revista (Editorial Caminho, 2008)
Capa do livro "História Luso-Árabe: Episódios e Figuras Meridionais", de Garcia Domingues, 2.ª edição (Centro de Estudos Luso-Árabes de Silves, 2010)
Capa do livro "O Meu Coração É Árabe: A Poesia Luso-Árabe", de Adalberto Alves (Assírio & Alvim, 1987)
Capa do livro "O Meu Coração É Árabe", de Adalberto Alves, 3.ª edição revista e aumentada (Assírio & Alvim, 1999)
Capa do livro "Al-Mu'tamid: Poeta do Destino", de Adalberto Alves, 2.ª edição revista e aumentada (Assírio & Alvim, 2004)
Capa do CD "Lendas do País do Sul", da Trupe Barlaventina (Concertante, 1999)
Design – Dimensão 6
Capa do CD "Andalusino", de Eduardo Ramos (InforArte, 1999)
Porta do castelo de Silves; figuras retiradas do livro "Cantigas de Santa Maria", de Afonso X, o Sábio, e foto de Eduardo Ramos (sentado, tangendo alaúde)
Montagem: Fernando Guerreiro e Eduardo Ramos
Capa do CD "Cântico para Al-Mu'tamid", de Eduardo Ramos (Eduardo Ramos, 2005)
Design gráfico – Carlos Rocha
Capa do CD "Al-Mu'tamid: Poeta Rei do Al-Andalus" (AMG Music/Carlos Gomes/Sony Music, 2015)
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